Por que é tão difícil encontrar pluralidade nas masculinidades atuais?
A cinebiografia cinco estrelas do cantor Ney Matogrosso está em cartaz nos cinemas. Na história, vemos a dificuldade do pai do artista em compreender e aceitar a forma como o filho vivenciava sua masculinidade.
“Embora eu me enxergasse como uma criança comum, que gostava de pintar, desenhar e cantar, meu pai me chamava de viado.”
Ney Matogrosso, entrevista ao Jornal da Tarde
Mas de onde vem tudo isso?
Os modelos de representação da masculinidade na história ocidental, de acordo com o Pedro Ambra, psicólogo e pesquisador de masculinidades, estão relacionados com o ideal viril que organizou e deu coesão à identidade masculina.
Essa virilidade mítica, de raízes europeias e inspiração nos heróis marciais, criou uma relação estruturante entre uma única forma de ser homem — logo, inalcançável — e as práticas cotidianas de expressão da masculinidade por muitos anos.
A identidade masculina é posta em cheque
No Brasil, apenas a partir das décadas de 1970 e 1980 esse modelo começa a ser contestado.
Mulheres, via movimentos feministas, passaram a questionar a dominação masculina. Gays, pobres e negros ocuparam espaços antes negados a eles. Esses movimentos ameaçaram a ideia de uma identidade masculina única, sustentada por instituições, políticas do estado e mídia.
Começa aí a primeira crise da masculinidade e a busca por “novos homens”.
Não é só uma nova crise e aqui mora o perigo
Pesquisadores apontam que o momento atual da história sociopolítica do Brasil, resgata desafios que pareciam superados, especialmente na ressignificação simbólica das masculinidades.
“Mais do que pensar a crise da masculinidade, é pensar a relação dos homens com o abalo do viril que nunca existiu. E é esse abalo que tem produzido repercussões no laço social.”
Flavia Gaze Bonfim, psicanalista e pesquisadora das masculinidades
E quando isso já aconteceu antes?
O historiador Durval Muniz de Albuquerque, no livro A Invenção do Falo Nordestino, conta que, nos anos 1920, houve um agenciamento da imagem da figura do nordestino, muito calcada no sertanejo e no caboclo, representantes da macheza e defensores da pátria, da família e da ordem, contra a “feminização” do país e o declínio do domínio econômico da região Nordeste.
Não vale a pena ver de novo
A nova reivindicação do viril busca o retorno à antiga ordem social, visando à manutenção das condições históricas de poder e dominação: do homem sobre a mulher, do hétero sobre o gay ou trans, do branco sobre o negro, da elite sobre o pobre.
Atualmente, pipocam os movimentos masculinistas que ganham capilaridade e força na manosfera: um ecossistema digital que reúne grupos como Redpill, MGTOW (Men Going Their Own Way), incels, sigma, entre outros.
E um de seus princípios é rejeitar a modernidade e resgatar uma tradição de inspiração quase medieval. E as consequências desse movimento vão desde impactos na saúde mental como a violência em uma resposta à dificuldade entre o que o homem é, e o que deveria ou gostaria de ser.
Segundo a Isabela Ventura, antropóloga e pesquisadora das masculinidades, homens morrem e matam muito. E não só mulheres, mas também outros homens. E se matam muito também. Isso fala de um aprendizado de ser homem até as últimas consequências.
E os dados comprovam:
- 258.941 mulheres vítimas de violência doméstica
- 540.255 Medidas protetivas concedidas.
- 1.467 feminicídios (crime de ódio ao gênero), o maior número desde 2015.
Fonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024
Mas tudo está perdido, então?
Desconstruir a masculinidade hegemônica nesse momento é utopia e não é prioridade para a maioria dos homens. Mas tem homens desconfortáveis com a dinâmica do viril.
Masculinidades híbridas
A masculinidade Híbrida surge do desconforto e é um dispositivo de mitigação dos impactos da masculinidade hegemônica. E atua como caminho complementar para a construção de uma nova masculinidade, que busca relações mais simétricas, pautadas na parceria, na reciprocidade e na conexão.
Nossa mais nova atualização do estudo contínuo sobre masculinidades, faz um retrato da pluralidade das masculinidades que compõem o cenário atual.
E aposta nas masculinidades híbridas como um bom percurso para marcas que querem se conectar com essa construção complementar de experienciar o masculino.
O Ney Matogrosso sempre foi uma expressão artística do abalo do viril. E uma das inspirações para esse novo estudo. Um homem emocionalmente complexo, respeitoso, audacioso e cheio de atributos que tensionam a masculinidade hegemônica.
Um verdadeiro homem com H.
Viu que não dá mais pra falar de equidade sem olhar para o papel dos homens, né?
É preciso ampliar a conversa sobre masculinidade com coragem, cuidado e profundidade. Nas empresas, a masculinidade deve ser vista tanto da porta pra dentro, como da porta pra fora.
Já pensou como sua marca se relaciona com os homens e com as mulheres de hoje?
Vamos conversar mais!
